terça-feira, 30 de novembro de 2010

Prisão das Palavras

Eu busco entender, mas confesso, não entendo; Tento falar e confesso, não consigo.

Eu busco escrever e não sai aqui escrito o que realmente sinto.

De volta ao telefone sem fio dentro de mim...

Mas eu tento; mais pela necessidade de trabalhar o que sinto
do que para trazer uma clara expressão do que sinto... Ah, são esses sentimentos de novo...

Dormir sem ter hora para acordar...
Fuga uterina, mala educación?

Quando pensamos deixamos de viver?
Se eu tiver vontade de chorar, poderei chorar?
E quando eu me mostrar sem máscaras você vai me aceitar?
Eu fico nu perante o espelho de minha alma; é quando silêncio preenche todas lacunas...

Ontem encontrei coisas perdidas e coloquei em lugares perdidos.
Hoje perdido em meio a palavras ouço gritos e suspiros de alivio.
Qual o sentindo mais profundo? O que nos faz viver?

Nós temos mãos que não acariciam,
bocas que não comunicam,
ouvidos que não ouvem,
braços que não abraçam,
e pernas que não andam...

Quando meu pássaro azul voa pra longe, eu me me chamo “falta”,
e o pensamento de ida sem volta me dilacera em pequenos aipins;
eu não sei falar,
não sei escrever,
e não sei amar...

Alguém aceita um ser que admite que não sabe amar?

Quando ousares partilhar de ti mesmo verás quem te aceita de verdade...
Fala-se da verdade como se ela não incomodasse.
Fala-se da mentira como se ninguém a usasse.
Eu sou talvez boa parte mentira e é ela a parte de mim vista e que talvez todos desejam.

Que bobo que sou. Achando estar entre amigos, ousei partilhar de mim. Me mostrei como confissão real e mostrei a minha verdade, a parte de mim que não era maquiagem;
e eu, tolo, esperei abraços e para minha surpresa, fui riscado em traços e colocado em pratos para ser devorado; e ouvi a acusação: FALSO!

Logo depois depois percebi de súbito que estava fora da caverna. Talvez nem quisesse sair de lá... Era a decisão: EXCLUSÃO!

Excluído pelos gansos obesos e paralíticos que se acostumaram com a prisão feita de palavras.

Estou perdendo peso pra voltar a voar...


Robson Freire

sábado, 13 de novembro de 2010

Oxalá

Ele cá mora, por mim anda,
perpassa as trilhas do meu ser
e faz de palavras parábolas...

Consegue curar minha língua travada: pra Deus e pro Mundo...
Retira minha cegueira,
me propõe viver liberto da lei
e voar pelas asas da liberdade...

Quero voar bem alto
com outros pássaros azuis, verdes, brancos, roxos e coloridos...

Ele grita: “Ninguém se fará senhor do outro.
O maior é o que lava pés
e o menor nessa terra se chama rei.

Ele me abraça e dança comigo um funk,
cantarola as músicas de Bituca pra me fazer dormir,
me fala de um dia chamado hoje
onde o leão será abraçado pela criança,
o ladrão será o primero da casa,
e o corrupto tem sempre os erros perdoados,
porque está entre pessoas que reconhecem que não são melhores que eles;
as mulheres não são mais produto,
são livres para serem,

e as crianças podem ser apenas crianças, livres da pureza...

O homem pode beijar e acariciar o outro sem medo de ser discriminado por isso,
pois já sabe que não é na ausência de afetividade que habita sua masculinidade e sim nisso:
em dar carinho e amar a todos
pois eles reconhecem e abraçam sua dimensão afetiva...

Os pastores usam seu cajados não mais pra machucarem as ovelhas
mas pra realmente espantarem os lobos.

Ninguém mais fala: “Assim diz o senhor!”

Deus está no outro:
quem encontra Deus no outro realmente encontrou a Deus,
mas quem encontra Deus longe do outro,
Deus me permita longe estar desse deus,
pois é deus dos abismos,
das separações,
da opressão,
da verdade imposta...


Oxalá, Mãe. Olaxa, Pai. Oxalá!


Robson Freire

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

O Espectador e a Bailarina - II

Amigo Espectador, oi!

Eu também partilho de sua insônia. Dizem que a noite é dos poetas, boêmios, artistas e pensadores. Se isso é verdade, não sei; mas se parece com você.

Você sempre consegue escrever aquilo que só consigo sentir. Sinto saudades de nossas conversas soltas pelas ruas. Nossos banhos de chuva. Sempre me alegro em saber que muitos de seus textos são resultado de nossas conversas banhadas de devaneios.

Algo que tem me intrigado são meus sonhos. Tenho tido sonhos de forte significado, e você estava em um deles. Nesse sonho você e eu dançávamos na pontas do pés, em cima de pontas agudas de um portão de ferro. Ainda não entendi o significado mas achei muito bonito.

Você disse que pensou em mim e que logo em seguida escreveu acerca da imagem que fazemos dos outros. Minha pergunta é: qual imagem você faz de mim?

Com sua carta, fez nascer em mim perguntas: quem sou? Qual caminho seguir nessa existência? E se preciso saber quem sou para seguir? Você me leva a pensar e repensar. Lembrei com isso de minha adolescência e de minha mãe falando dela.

Minha mãe parece que viveu a minha adolescência mais do que eu mesma. Lembrei que sempre que ela conta as velhas estórias, ela acaba tirando ou acrescentando um fato novo. Então cheguei à conclusão de que não se deve confiar na memória.

Não se lembrar do que se pensava antes, não seria então não ter uma total e clara percepção do entendimento de quem se é?

Reconhecer que não se conhece é assustador de mais.

Você sempre me leva a refletir, e de certa forma isso me dá medo, e ao mesmo tempo desperta algo dentro de mim que me instiga e me deixa curiosa. Leva-me a querer ouvir mais, a querer ler mais.Talvez com suas palavras e escrita você tire meu chão, as poucas certezas que tenho.

Quando era adolescente, buscava entender quem eu era. Sempre levei tudo muito a sério, e passei por ela sem saber e hoje percebo quem eu era. Já não sou mais adolescente agora, ou seja, quando percebemos quem somos ou achamos que sabemos, o tempo passa e já não somos mais ou não percebemos mais?

Fiquei pensando nisso, será que estamos destinados a perceber algo e entender quando já não somos mais?

Percebi que quando se pergunta a uma pessoa quem ela é, ela responde o que ela faz ou o que deseja fazer. Somos nosso ofício? E me achei muito pequena diante disso, pois somos o que fazemos. Nesse momento me senti sem muito sentido.

E somos também o desejo de fazer algo (sonhos), e esse se faz mais amedrontador ainda, pois se não alcançarmos o objetivo, então seremos um nada não alcançado, um fracasso e se alcançarmos o objetivo isso também me amedronta, findaria o sentido de nossa existência, pois já o alcançamos. Poderíamos ter outros desejos e corre atrás deles e depois de outros, nossa existência seria reduzida a uma única palavra: desejo (hedonismo).

A vida toda se resumiria a isso, e realmente isso é ilusão, tudo ilusão. (Quem disse foi Salomão, não fui eu, ele chegou a esse pensamento antes de mim.)

Então, se percebemos esta condição em que estamos, temos a opção de sair ou permanecer na caverna, mas será uma escolha consciente. E se escolhermos sair, como seria? Pensei em Deus; não há um que em sua existência não tenha pensado sobre.

Se o homem criou Deus, então o homem é Deus. Mas se foi Deus quem criou o homem, então estamos cometendo um erro.

Se o homem não se conhece, como pode conhecer o outro?

Acho que te deixo mais perguntas do que respostas, mais lacunas... Fico por aqui aguardando seu retorno. Me ligue assim que der, sua falta é grande.


Bailarina

(Trecho de "O Espectador e a Bailarina" )

Robson Freire