sexta-feira, 5 de novembro de 2010

O Espectador e a Bailarina - II

Amigo Espectador, oi!

Eu também partilho de sua insônia. Dizem que a noite é dos poetas, boêmios, artistas e pensadores. Se isso é verdade, não sei; mas se parece com você.

Você sempre consegue escrever aquilo que só consigo sentir. Sinto saudades de nossas conversas soltas pelas ruas. Nossos banhos de chuva. Sempre me alegro em saber que muitos de seus textos são resultado de nossas conversas banhadas de devaneios.

Algo que tem me intrigado são meus sonhos. Tenho tido sonhos de forte significado, e você estava em um deles. Nesse sonho você e eu dançávamos na pontas do pés, em cima de pontas agudas de um portão de ferro. Ainda não entendi o significado mas achei muito bonito.

Você disse que pensou em mim e que logo em seguida escreveu acerca da imagem que fazemos dos outros. Minha pergunta é: qual imagem você faz de mim?

Com sua carta, fez nascer em mim perguntas: quem sou? Qual caminho seguir nessa existência? E se preciso saber quem sou para seguir? Você me leva a pensar e repensar. Lembrei com isso de minha adolescência e de minha mãe falando dela.

Minha mãe parece que viveu a minha adolescência mais do que eu mesma. Lembrei que sempre que ela conta as velhas estórias, ela acaba tirando ou acrescentando um fato novo. Então cheguei à conclusão de que não se deve confiar na memória.

Não se lembrar do que se pensava antes, não seria então não ter uma total e clara percepção do entendimento de quem se é?

Reconhecer que não se conhece é assustador de mais.

Você sempre me leva a refletir, e de certa forma isso me dá medo, e ao mesmo tempo desperta algo dentro de mim que me instiga e me deixa curiosa. Leva-me a querer ouvir mais, a querer ler mais.Talvez com suas palavras e escrita você tire meu chão, as poucas certezas que tenho.

Quando era adolescente, buscava entender quem eu era. Sempre levei tudo muito a sério, e passei por ela sem saber e hoje percebo quem eu era. Já não sou mais adolescente agora, ou seja, quando percebemos quem somos ou achamos que sabemos, o tempo passa e já não somos mais ou não percebemos mais?

Fiquei pensando nisso, será que estamos destinados a perceber algo e entender quando já não somos mais?

Percebi que quando se pergunta a uma pessoa quem ela é, ela responde o que ela faz ou o que deseja fazer. Somos nosso ofício? E me achei muito pequena diante disso, pois somos o que fazemos. Nesse momento me senti sem muito sentido.

E somos também o desejo de fazer algo (sonhos), e esse se faz mais amedrontador ainda, pois se não alcançarmos o objetivo, então seremos um nada não alcançado, um fracasso e se alcançarmos o objetivo isso também me amedronta, findaria o sentido de nossa existência, pois já o alcançamos. Poderíamos ter outros desejos e corre atrás deles e depois de outros, nossa existência seria reduzida a uma única palavra: desejo (hedonismo).

A vida toda se resumiria a isso, e realmente isso é ilusão, tudo ilusão. (Quem disse foi Salomão, não fui eu, ele chegou a esse pensamento antes de mim.)

Então, se percebemos esta condição em que estamos, temos a opção de sair ou permanecer na caverna, mas será uma escolha consciente. E se escolhermos sair, como seria? Pensei em Deus; não há um que em sua existência não tenha pensado sobre.

Se o homem criou Deus, então o homem é Deus. Mas se foi Deus quem criou o homem, então estamos cometendo um erro.

Se o homem não se conhece, como pode conhecer o outro?

Acho que te deixo mais perguntas do que respostas, mais lacunas... Fico por aqui aguardando seu retorno. Me ligue assim que der, sua falta é grande.


Bailarina

(Trecho de "O Espectador e a Bailarina" )

Robson Freire

3 comentários:

  1. "Algo dentro de mim que me instiga e me deixa curiosa. Leva-me a querer ouvir mais, a querer ler mais."

    Isso se resume por mim.
    Cade vez melhor!

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  2. Quando a bailarina diz que somos o desejo de fazer algo e quando nao conseguimos alcançar tais objetivos acabamos não sendo nada, sinto um medo e ma vontade de botar pra frente toos os meus sonhos... mas as vezes me falta mta atitude =/

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